Psicanálise e o surrealismo – Formas de sublimação

Da psicose paranoica em suas relações com a personalidade – Lacan

Um dos temas sugeridos para a pagina foi a arte como forma de sublimação em psicanálise, para inaugurar essa série, pensei em começarmos falando sobre o surrealismo, um seguimento da arte que muito me encanta e provoca.

Lacan em sua obra “Da psicose paranoica em suas relações com a personalidade” agrega seus primeiros escritos sobre a paranoia. Uma das questões propostas foi o problema do estilo e a concepção psiquiátrica das formas paranoicas da experiência, onde nesse texto, destaca-se a presença do surrealismo.

Tal escrito de Lacan não foi bem recebido pela comunidade psiquiátrica, seu trabalho foi acolhido então pela revista minotaure, parte de um movimento de surrealistas. Recebido por Salvador Dalí, o mesmo alega que as ideias de Lacan já haviam sido pensadas anteriormente por ele, ou seja, que a paranoia é uma forma de conhecimento, assumindo uma dimensão de método, um programa de investigação que coloca o mundo como uma projeção do meu olhar para mundo, como algo que está orientado para a minha posição.

Em oposição ao que foi dito por Salvador Dalí, Lacan diz que não é que o paranoico tenha apenas uma propensão de conhecimento, ou seja, que esse conhecimento alcance um fragmento de verdade, mas sim, que todo o conhecimento que ele produz é em si ele mesmo em uma estrutura paranoica.

Lacan buscou estudar uma noção crítica da personalidade baseando-se no desenvolvimento biográfico, na capacidade de síntese de representação, na tensão entre as estruturas ideais (Simbólicas) e sociais de reconhecimento de si, e por último no real que não se junta a essas estruturas. Lacan pensa no “EU”, como uma estrutura paranoica, tendo esse “EU” como uma estrutura projetiva de sintoma e de duplicação.

E aqui encontramos a relação entre o sujeito paranoico e o surrealismo, onde podemos pensar que para esse sujeito, o acesso a realidade está comprometido por estruturas de imediação que o impedem de se apropriar da verdade que está em jogo na realidade, por isso para alcançar a verdade sobre a realidade, o sujeito duplica a realidade, trabalhando suas obras através de uma realidade deformada, no entanto, duplicando a realidade daquilo que poderia ser um sonho, um transe, uma alteração de consciência.

Nessa duplicação aparece um intervalo onde se dispõe ao sujeito uma possibilidade de transformação, de introduzir uma nova forma de ser. Lacan percebe que o surrealismo é uma forma de disciplina, um estilo de vida, um movimento, algo que diz de uma ética, e percebe que a psicanalise também diz de uma ética, estando em uma ordem de profissionais delirantes que segundo ele, seria esse conjunto de profissões que dependem da forma como o outro as enxergam e como é percebida por esses outros, ou seja, algo que diz de uma estrutura paranoica, que envolve um fazer determinado por isso.

Podemos pensar assim, na obra de arte como um ato, um ato que introduz uma descontinuidade na realidade, permitindo que o sujeito veja do que é feito a realidade e como a realidade é composta pela subtração do fragmento, fragmento este que Lacan ira chamar de real, e assim o autor pensa nessa relação entre o surrealismo e a psicanálise, ou seja, a ideia de ato poético e a ideia de ato analítico. A ideia de alcançar a realidade parte de uma projeção, uma deformação, como um sistema simbólico/imaginário que uma vez desentranhado, revela isso que volta sempre ao mesmo lugar, o real.


Fontes: Psicanálise e surrealismo | Christian Dunker | Falando nIsso 201
A ficção como teoria: revisitando as relações de Lacan com o surrealismo – Richard Theisen Simanke

Psicólogo Bruno Moraes
@Psicanalisenacultura

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