Afinal, quanto tempo o tempo tem?
O tempo como nós ordenamos é um instrumento indispensável de orientação, uma construção imaginária útil para nos situarmos, tal sua presença tão consistente no cotidiano. Estudado na filosofia, nas ciências humanas e naturais, o tempo carrega essa natureza marcante e enigmática.
Na situação analítica, o tempo não corresponde ao tempo neurótico, e sim a lógica do inconsciente e a ética da psicanálise. Essa burocratização do tempo, tentativa de controla-lo, nos atropela em ritmos de funcionamento que organizam nossa vida e nossa morte, abrange uma lógica do poder.
Para nós, sujeitos de linguagem, compactuados com a lei nesse movimento de civilização, são apresentados modos de coordenar e de se submeter ao tempo. O relógio, por exemplo, é uma invenção que transmite essa ideia de que o tempo corre em um fluxo contínuo. Até o tempo do universo, independente do viver humano, só adquire valor se articulado à experiência de linguagem. Mesmo com todas as tentativas de controlar e ordenar o tempo — que vestem uma roupagem, muitas vezes, excessiva — há algo de que não é possível escapar: o tempo passa. O futuro incerto nos reserva apenas a certeza da morte.
O tempo do sujeito: Consciente e inconsciente.
O inconsciente revela uma lógica afastada do campo da consciência: presente, passado e futuro se alinham, não se separam. Essa atemporalidade se relaciona com o sujeito do desejo, representado por um significante para outro significante, que em alguma outra cena se repete e insiste. É a partir da pontuação do texto do analisante que o inconsciente apela sua abertura. A análise é poética… Acontece em cortes, pontuações, grifos… “O analista, como o inconsciente, não se preocupa com o tempo, mas corta a sessão em função da fala do analisante” (QUINET, 2019). O trabalho analítico questiona tais produções imaginárias, produções essas que o neurótico sofre pelo excesso de sentido. Não há Outro do analista e o tempo não se fixa como garantia ao analisante. A direção da análise é guiada pelas manifestações do inconsciente: quando o analisante entra em uma sessão sem saber quanto tempo esta se desenrolará, estará ele sob o impacto da pressa de concluir, que vinculada ao enigma, faz surgir o desejo como questão.
Referências: QUINET, A. As 4+1 condições da análise. Zahar: Rio de Janeiro, 1991.